sexta-feira, outubro 31, 2008

Objeto sujeito

Coisifique-me, me transforme em pedra, madeira, carvão, ouro, diamante ou planta. Me coloque na sua prateleira. Me transforme em lixo, reduza-me a cinzas. Julgue-me, olhe para mim de cima abaixo, meça o tamanho do meu nariz, da minha cabeça, olhos e orelhas. Olhe dentro da minha boca, examine os meus dentes. Me acaricie como se eu fosse seu animalzinho, faça eu rastejar e comer da sua mão. Me faça implorar por atenção, por um pouquinho do seu tempo. Dono da comida, que diz quando eu devo comer, quando eu devo dormir, quando eu devo existir.
Regule o ar que eu respiro, me lance um milhão de agonias, me traga estresse, faça meu coração bater em intervalos cada vez mais curtos. Me feche num quarto escuro. Me faça repetir todas as suas verdades, me faça entrar na sua pele seca e descascada e sentir as suas impressões de mundo. Faça eu calçar os seus sapatos apertados para correr quilômetros. Arranque os meus cílios para que eu não durma. Costure minhas pálpebras para que eu não veja nada. Amarre minha boca para que eu não reclame e prenda os meus braços para que eu não arranque cada pedacinho do seu corpo. Coisifique-me, me analise. Finja que somos todos desprovidos de emoções. Coloque tudo no seu contrato, e depois enfie no seu *.

sexta-feira, outubro 24, 2008

ESCOLA

Eu aprendi que você já nasce devendo, sem crédito nenhum.
E tem que se esfolar para conseguir quase nada,
e quando consegue, são quase sempre críticas de um dedo que prefere apontar que se tocar.
Somos ainda vassalos de senhores feudais,
e devemos agradecer pelo pão amassado pelo diabo. --"Cala a boca e come!", porque poderia ser nenhum.

E a revolução já começou, dentro de mim, já começou. Existem milhões de lutas, para andar pelos dias sem deixar me prender pelas mãos sujas, pelos famintos de alma. Mas essa guerra interna está me deixando doente e sem energia. E quanto mais dias vou ao mundo, menos energia tenho para a luta, quanto mais luto, menos alguém ganha, quanto mais perco, mais um dia a menos. Entende? Talvez seja de propósito. Talvez eu esteja mesmo buscando a morte. Talvez eu tenha plena consciência do alívio que ela trás. Talvez eu queira escolher. Talvez Rodrag estivesse certo. Talvez ele tenha se libertado da roda. "Talvezes" lutam dentro de mim. As células estão vivas; elas querem comer. Elas clamam pela vida.

Percebe: o que eu sei é que o tumulto que vejo aqui fora se iguala ao tumulto aqui dentro. Porque na escola não ensinam como lidar com esses trajetos? Quem vê nuvens, acordou nublado. Quem vê sol e amaldiçoa o astro, é porque está se queimando. O que está dentro é como o que está fora, o que está em cima é como o que está embaixo. Isso eles não ensinam na escola. A escola é uma bosta. A educação se perdeu tanto quanto o meu texto. E a escola é a instituição que perpetua a burrice. Ela copia e ensina a copiar, vide Estamira. E a Igreja também é uma escola, é a escola do demônio, porque ela é a religião dos homens e o inferno somos nós. Controle burro: não obrigada.

O que sai de valor desses lugares são as ovelhas desgarradas. Viva as ovelhas desgarradas.

Sofia

O cabelo é vermelho e preto. Como filha do Diabo. Minha mãe inferniza minhas manhãs e sai. Por todos os dias da minha vida, essa foi nossa rotina. O forró que o porteiro canta me acorda. Ele liga o som às alturas. O canto é desafinado como uma sirene. As panelas e pias de todas as cozinhas do condomínio se ampliam até chegar na minha janela. O cachorro do vizinho chora um choro estridente. Ele não pára. As crianças gritam, chamam pela mãe, brigam, gritam mais alto, quebram tudo. A mãe só vem para gritar, brigar, por causa do comportamento das crianças. A vizinha da casa de trás também grita com os cachorros. Ela é um dos cachorros. Ela late. O marido dela é mudo. Ela late. O marido dela deve ser surdo. Todos os outros vizinhos não são; entreolham-se das janelas, em silêncio. Por que contribuir com mais barulho? Há sempre um martelo, uma serra, em algum lugar por perto, sempre uma bateção, sempre uma briga de família, sempre uma obra durante os dias. Ainda no sol do meio-dia, tudo fica mais difícil. Se ficar em casa é não ter sossego, então acostuma-se com a fluência dos pensamentos e a buzina dos carros, o freio dos ônibus, a falação constante e inconsciente. A televisão ligada junto com a panela de pressão. A Ana Maria Braga, aquele papagaio agudo, tudo vai na panela de pressão e na comida que vai alimentar aquela casa em poucas horas. Tudo isso me causa um desespero e agonia. O Jesus na cruz está preso na porta de casa; é uma casa cristã. Engraçado como as pessoas cristãs gostam de infernizar os outros. Sempre criando infernos pessoais, sempre pedindo a Deus, nas filas do metrô, do banco... Sempre contribuindo para as coisas infernais do mundo, sempre cuspindo suas interjeições e os seus beijos pros santos. Meditação, ioga... Blasfêmia! Razão para se fazer mais barulho. Antes houvesse apenas vazio.

segunda-feira, outubro 20, 2008

LÓGICA E INTUIÇÃO

O pragmatismo é um exercício constante para uma pessoa cujo mercúrio tem traços netunianos. Traduzindo: é necessária uma dose extra de atenção para realizar a comunicação de modo claro, objetivo e direto para uma pessoa que entende a linguagem como um conjunto de símbolos, nem todos eles verbais.
A linguagem verbal pode ser enfadonha e, muitas vezes, prefiro me abster dela. O silêncio me satisfaz por completo.
A comunicação para mim não se dá em trocas de teorias e opiniões, e sim muito mais em uma troca energética, mas encontro um sem número de pessoas incapazes de se comunicar nessa língua. Até eu mesma, que seria o mais natural para mim, muitas vezes me perco nas informações, devido ao tempo imerso na língua estrangeira (essa língua falada pelo mundo).
Encontrei o motivo central da minha luta atual entre o conhecimento teórico, mental, acadêmico e o conhecimento de mundo, sentido, absorvido: é o mercúrio netuniano me pedindo atenção, ao que realmente importa. Esses dois mundos importam. Porque eu preciso obter fluência na linguagem do mundo para que eu, do meu mundo, consiga me comunicar com todos aqueles que não são nativos da minha linguagem pessoal. Engraçado estar me formando em Tradução.
A informação que sai da boca das pessoas e a informação que obtenho a partir da vibração energética dos seus corpos, a posição dos membros, o movimento de mãos, pés e olhos são, muitas vezes, dissonantes. E eu tenho acesso às entrelinhas. Às vezes, nem o emissor da mensagem tem. Às vezes, percebo ansiedades e outros sentimentos ocupando a atenção daquele que está falando. Às vezes, percebo a barreira que certas pessoas colocam para se proteger, e vejo a força que várias armaduras têm. Muitas são eficazes. Eu mesma tenho as minhas. Devido a minha consciência sobre esses fatores, muitas vezes manipulo esses detalhes no meu corpo, levando a pessoa a uma dupla mensagem. Daí que ninguém sabe muito bem o que eu quis dizer com aquilo que eu disse, daí que muita gente desconfia. É o risco que eu corro ao jogar com a linguagem, que realmente pode ser uma faca de dois gumes. Assim como pode ser a proteção; ela pode ser adequada, mas nós as usamos em tempo integral. Agimos no mundo como se nos defendêssemos. Deixamos de trocar.
Abusamos da linguagem verbal e de seus signos, mas estamos trocando referenciais vazios.
-Eu demorei mais de dois meses pensando sobre o assunto para construir essa teoria.-
O que realmente importa na troca: energia. Deixar os sentimentos vazarem na comunicação. Falar exatamente de acordo com o que se sente. (= problema no mundo do "real".) Ter sensibilidade ao falar, claro, mas não conter a energia, deixá-la fluir. Manter a comunicação em aberto, em via dupla. Falar, mas querer escutar o outro, por inteiro, não somente as suas palavras. É um abraço de corpo inteiro, não só de rostos, não só de plexos solares.
Essa é a comunicação que eu procuro.
Por isso tenho preferido me comunicar através da música. É com ela que sinto a eficácia nesse tipo de comunicação. Os referenciais verbais podem ser tão frios e vazios, porque as pessoas retiram deles o conteúdo energético. Já na musicalidade, elas não têm muita escolha. Porque a música penetra, mesmo naqueles que se sentem protegidos, defendidos e ofendidos contra os gêneros musicais. A música causa o desarmamento ou o armamento, mas isso quer dizer que a pessoa escuta.
Voilá! Mensagem construída. Que alívio!
Boa semana.

domingo, outubro 19, 2008

A doença social dos "sem-paixão"

A doença social dos "sem-paixão" é um mal que ataca muita gente. É uma doença coletiva. Há pessoas fazendo de tudo para recuperar a paixão perdida; muitas ficam viciadas em crises, outras arrumam brigas, algumas fazem coisas perigosas, e tudo para reavivar "o morto". Mas a maioria acorda de manhã e vai trabalhar, volta para casa dia-após-dia, afirmando não sentir absolutamente nada, por nada nem por ninguém. Pessoas que estão em relacionamentos mas que não conseguem tempo hábil e energia para investir em surpresas e em iniciativas legais, estão sofrendo desse mal. E a cada dia a doença faz mais vítimas, mas não há previsão de cura. As causas são muitas e o tratamento é pessoal, apesar da doença ser social.

am I becoming so boring

ontem, sábado à noite, namorado em casa, preferiu ir dormir do que ficar acordado brigando comigo; foi um final de semana daqueles... fiquei sozinha acordada, assistindo à lista das 40 músicas mais importantes na história do metal, programa apresentado pelo sebastian bach... fui que fui, da quadragésima à primeira. o momento auge da noite: alice in chains estava na lista, e o jerry cantrell apareceu falando, ao lado de uma senhora inchada e morena, chamada mike inez. álcool, minha gente... e é, o tempo passa. poucas bandas apareceram duas vezes: judas priest, pantera, guns and roses, black sabbath, iron maiden, metallica... quem mais? na lista estavam ainda: def leppard, anthrax, skid row, twisted sisters, kiss, acdc, SEPULTURA, korn ("the best band EVER named after a veggetable" - pérola do sebastian), rage against... Ah, e uma banda que cantava "balls to the wall" (O.o). Enfim: nos embalos de sábado à noite. And my life has become so fucking boring to the viewers' eyes, but I had a good time.

-às vezes o bom humor precisa vir de uma guitarra distorcida.

quinta-feira, outubro 16, 2008

Mini-conto

Estava cansada da sua vida até ali. Até que recebeu um telefonema, e sua vida mudou.

Re-presentando o passado

Oi vento quente, hum... Vem trazendo o passado. Sinto o cheiro do cloro da piscina do Tijuca. Os passos ensopados na sandália de plástico argentina e a prancha de isopor em baixo do braço dirigem-se para a Vovó Catarina, na Henry Ford. Empadão de queijo de domingo. Olhos vermelhos e irritados de cloro, roupa molhada, desconforto de calor e cansaço. Felicidade boba de um dia ensolarado num bairro conservador do Rio de Janeiro. Os mesmos morros, as mesmas cores ainda reinam. Os mesmos cheiros ainda aparecem, trazidos pelo vento.