domingo, fevereiro 25, 2007

O seu último dia de vida

O último dia da vida dela

Acordou, sentou-se na sala, fez carinho na gata, deitou-se, dormiu por cinco minutos relembrando o sonho que teve na noite anterior. Levantou-se, fez carinho na gata, foi até a cozinha tomar café da manhã. Viu que a mãe havia comprado pães e pães- doces. Viu que um dos pães-doces estava cheio de formigas. Limpou as formigas. Sentou-se, comeu. Foi até o quarto, tentou dormir mais um pouco mas não conseguiu porque queria escrever o sonho e porque estava espirrando. Abriu a gaveta, retirou o diário e foi até a sala novamente para escrever. Escreveu. Acabou a tinta da caneta antes que ela pudesse terminar a lista das pessoas que gostaria de ver no seu aniversário. Na noite anterior, teve sonho de festa aonde ela não podia entrar, porque só podia entrar quem se vestia diferente, e só depois ela foi entender, no sonho, que o diferente era ser alienígena vestido de gente, e que a festa era para a família do outro, que era composta por alienígenas, e ela não sabia qual deles era aquele que andava dormindo com ela. Ficou intrigada com o sonho, sabia que o outro e sua família eram alienígenas. Sabia o que ia acontecer.
Esta foi sua manhã.
Depois, as amigas vieram à sua casa. Conversaram, discutiram suas relações problemáticas com seus respectivos, traçaram planos, conversaram mais, riram de como os homens são babacas e resolveram ir à praia. Mas antes, comeram uma refeição feita em casa na última quinta-feira. Hoje era domingo. Mas antes, ela teve uma conversinha tola ao telefone com o outro em questão. Alguém bem pequeno. Um outro que pela pouca idade não sabia de quase nada. Ela decidiu não continuar com aquilo. Idades diferentes, pensamentos diferentes. Vontades diferentes, visões diferentes. Mas a mesma conclusão. Houve um pé-na-bunda em sua tarde. Mas dessa vez foi dado, não recebido. Ela ficou feliz, porque conseguiu dizer o solene “não”, de “não quero isso para mim”, que a deixou bastante orgulhosa. Mas teve que ouvir antes uma conversinha tola ao telefone sobre AIDS, sobre como ele havia feito sexo oral sem camisinha com outra durante o carnaval e, que agora, estava preocupado. Teriam que fazer exames. Ela riu. Não existia aquele nós. Achou melhor ouvir isso ao telefone do que ao se encontrarem, pensou. Assim não precisava encontrar. Tudo ficava resolvido ali. Cada paranóia com seu dono. O menino solto em suas aventuras, com muito medo de contrair AIDS. A mulher livre para encontrar o amor. Comeram. Saíram para a praia, lindas, durante o pôr-do-sol. Chegaram à Ipanema, o sol estava colorindo o céu em cores de fogo degradê. Ela e a amiga resolveram pular no mar. As duas com medo de água fria e ondas até o pescoço. As duas com medo de bichos que nadam sem ser vistos e lixo flutuante. Ficaram no mar por um instante e tentaram sair antes da maré subir, antes que as ondas começassem a ficar mais agressivas. Medo de onda. Correram até a areia. Ela sentiu-se aliviada de, pela primeira vez, mergulhar no mar com gente medrosa também. Dava mais coragem, sentiu-se aliviada, conseguiu aproveitar mesmo que por um instante. Quis tomar uma água de côco. Foi uma delícia, apesar de ter que se desviar das pessoas que estavam se recusando a admitir o fim do carnaval daquele ano. Essas pessoas a incomodavam bastante.
Encontraram mais amigas, amigas de ex-namorados, amigos recém feitos em festa gay. Andaram, andaram, andaram. Resolveram ir andar de pedalinho na Lagoa. Mas antes, ela pediu para a amiga parar num posto, para ela comprar um sorvete. Comeu o sorvete, chegaram tarde ao pedalinho. Já estavam recolhendo os cisnes. Ela ficou muito triste. Ela queria muito ir até o meio da Lagoa com o pedalinho de cisne.
Todos se despediram. Elas voltaram para o carro, resolveram ir para casa. Foram para casa. Ela pensando que será um dia maravilhoso aquele em que conseguirem voltar lá para andar de pedalinho durante o pôr-do-sol. No caminho para casa, no túnel Rebouças, levou um tiro na cabeça e morreu.

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Minha gata é a coisa mais amada. Enquanto isso, ela é mais bem tratada do que muita criança. Isso mexe comigo de uma forma incrível, mas eu aprendi a reprimir esses sentimentos, porque poderia ser uma pessoa mais feliz. Meus pais me ensinaram cedo que eu, sozinha, não poderia mudar um mundo inteiro, que eu deveria me preocupar apenas com os meus problemas.
Existem pessoas sofrendo mesmo, uma enorme dose de sofrimento. E eu tenho a minha vidinha. Será que a lei cármica é mesmo cada um pelo seu umbigo? Será que é melhor eu ficar fora de onde não sou chamada? Será que não há nada que eu possa fazer? Aí aceitei uma lei que é a lei do forte. Na lei do forte sobrevivem os sobreviventes, e evoluem os que vivem. Quem sobrevive precisa se preocupar com a subsistência, enquanto vivem os que podem. Só podem se preocupar com evolução as pessoas que não precisam se preocupar com sobrevivência. Nesse sentido, me preocupando com a minha própria evolução eu estaria ajudando um mundo inteiro de pessoas a evoluir. Eu, na minha vivência, escapando por pouco da sobrevivência.
Eu fico muito puta de uma parte da população mundial precisar sofrer. Eu sofro muito por este peso que não é meu. E pra onde vai isso, dentro de mim? Amidalites? Dores do estômago? Dores de cabeça?
As pessoas se isolam e acham fino não perguntarem sobre a vida íntima alheia. Enquanto isso, quebro as regras de polidez, pois quero saber quem é o semelhante que está ao meu lado. Como internalizou as experiências de infância, quem foi sua mãe, quem foi seu pai, quais foram seus traumas, suas histórias engraçadas. Eu me interesso por saber as histórias que as pessoas foram ensinadas a esconder. Mas eu quero saber. Eu não sou uma pessoa mais feliz por não saber o que acontece no resto do mundo. Eu não sou uma pessoa mais feliz por ignorar os processos alheios. Então, sim, a ignorânia é uma bênção, pois os ignorantes podem ser felizes. Mas aonde fica a felicidade para as pessoas que não ignoram?
E o que fazem essas pessoas com as coisas que sabem?

A roupa é o saco plástico do corpo

A roupa é a fantasia de todos os dias. A roupa é a cara que eu visto para enfrentar as situações. Se eu estiver certa, mas a roupa estiver errada, nada bom acontece. A roupa precisa estar de acordo. Olha que infeliz: eu não tenho senso se valor próprio. As pessoas de Saturno na casa quatro vêm tentar me ensinar como desenvolver senso de valor sobre si próprio: estou atenta. Meu Saturno de casa 10 diz: sua imagem é tudo o que você é, portanto, tome cuidado!
Meu valor se baseia nos olhos externos, então eu preciso enganá-los, pois já que eu não vejo o meu valor, os outros também não verão, só verão a roupagem.
Há uma roupa para cada estação do humor. Dando ênfase às indecisões internas, os períodos entre uma e outra estação, aqueles de total indefinição, quando a roupa parece nunca se adequar. A escolha da roupa então parece refletir o desconforto entre ter que escolher sobre o que não se pode escolher. Quando a roupa reflete uma decisão insegura, assim eu saio às ruas. Sem saber como vão me olhar. Mas quando a roupa é escolhida de acordo comigo, então nem me importam as pessoas! Assim sigo. Há as que uso para aparecer em festas, as que uso para me esconder, as que escolho em ocasiões de viagem, as que uso na praia, as que uso para a casa dos outros, as que uso para ir jantar e ir ao cinema, as que uso para o trabalho, as que uso para o palco. Etc. A cada nova situação, a roupa precisa estar de acordo comigo & o ambiente precisa estar de acordo comigo. Se o ambiente e a roupa estiverem de acordo comigo, então eu sou feliz. Olha que infeliz: para ser feliz, preciso que aquilo que está fora seja confortável para o que está dentro. O que está dentro não é suficiente. Eu não sou o ambiente aconchegante, eu não sou a roupa bonita. O que eu sou está entre uma coisa e outra. O que eu sou não é.

Try to figure out that one.
Eu vou ao motel com você, mas preciso me vestir de 'super heroína sexy', aí tudo funciona. Eu posso cantar no palco, mas preciso me vestir de 'cantora auto-expressiva'. Eu posso ir à praia, se estiver vestida de 'senhorita natureza'. Eu posso ficar nua, pois estarei vestida de corpo. Eu saio à noite, e vou me divertir muito, se estiver vestida de 'party girl'. E assim visto, todos os dias, as minhas fantasias.. É assim que vou começar a olhar sinceramente para minhas roupas: fantasias do meu ser.

(Refluxo de carnaval)

Tantas são as coisas necessárias que precisam estar concatenadas para eu estar bem que às vezes eu simplesmente canso e preciso não estar nos lugares. Seria mais fácil que eu estivesse bem e relaxada para que nada fosse necessário nunca. :D Tenho sido mais ninguém, e quanto mais ninguém eu sou, mais me sinto eu. :D

Algumas pessoas vão saber ler o período acima. Vão identificar o caos pisciano de seguir o fluxo da vida como surge e a necessidade absurda de controle por organização do virgem. Novamente, onde eu estou? Entre uma calça boca de sino e um top gótico. Entre uma sinfonia e um pagode. Lua cheia ou minguante? Go figure.

Olhos virados para fora, virem para dentro.

Qual é a felicidade máxima de um saco plástico?

Qual é a felicidade máxima de um saco plástico? Carregar coisas dentro ou ser carregado pelo vento? Estou sentada na varanda, assistindo ao espetáculo... O saco parecia bem feliz voando... Ou será que eu estaria bem feliz em ser o saco, poder voar com o vento e então, imitei a sonoplastia de um saco bem feliz voando? Seria eu bem feliz sendo um saco plástico rasgado, sendo levado pelo vento? Voaria eu bem feliz sobre as casas e árvores? Estaria eu, enquanto saco plástico, me divertindo pelo mundo, sendo atropelada por carros, sem que nada me acontecesse?
Qual é a felicidade máxima de um ser humano?

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Ruas esburacadas do meu não ser

Paralelepípedos são meus sapatos e eu ando nas ruas esburacadas do meu não ser. “Joga pedra! Joga pedra!”, pareço ecoar para as pessoas que se mostram devagar nos becos por onde passo. Uma “drag queen madaleniana”, de dois mil anos atrás, só que nos dias atuais. A transexual que se casou com Jesus, em busca de uma próxima vida mais amena, mas que só ganhou mais culpa. Culpa por ser transexual, culpa por se casar com um messias, culpa porque ele era tão limpo e o reflexo da luz e por ela ser apenas uma versão imunda da escuridão; culpa porque os seus frutos nunca seriam reconhecidos, culpa de ter se permitido entrar neste papel.
Travestida entre os profetas, para que ninguém a percebesse mulher. Mascarada de violência e vergonha por ser quem era. Sim, ela teve os ensinamentos dele e mais! Mas não ousamos saber ou questionar, aonde foram parar tais textos.
“Meretriz! Meretriz!”, ouço alguém chamar e rio com escárnio. Cruzo a esquina e me debulho em lágrimas, por um orgulho falso de ‘não sei quem sou caso não me faça de forte diante do atacante’. Pedras me faltam, para o número de pecados aos quais eu me restrinjo, e em pedras eu piso. Pois cantar eleva a mente e o coração, mas se voar como o amor por nada. E hoje, eu estava tocando com as algas presas em baixo da minha concha, com os bigodes embebidos de embaraço.
A voz sai, mas ela prende o que eu grito. Por isso, sai diferente. Eu quero falar, mas a crítica vetou meu poder de voz em seu reinado. Ela inspecionará, em breve, também outros reinos.

As viagens de um filme

Começar uma relação sem saber aonde se vai é como ficar uma hora e meia assistindo a um filme, se envolvendo com os personagens, participando da trama e não ver o final.
Eu fiquei inspecionando na minha cabeça hoje sobre umas coisas bem estúpidas, daquelas curiosidades que não levam a lugar algum. Não sei de onde vieram, nem para aonde vão. Sabe? Tipo, o que deve sentir a mulher “beautiful” do James Blunt, aquela que ele encontrou no metrô e que estava com outro homem, mas que sorriu pra ele, como um anjo... Se é que ela se lembra dele. Se ela se lembra, como deve se sentir? Sabendo que aquele desconhecido que a viu por alguns minutos fez uma música pra ela, para aquele momento de minutos. Minutos que foram eternizados e que agora possuem grammies. Tudo porque ele achou que aquele início valeria a pena; escrever sobre aqueles minutos idiotas no metrô. Agora ele está rico, e ela está com a vida dela. Ela não tem crédito nenhum por ser a musa dele. Só o que tem é a lembrança. Nenhum dos dois viu o final do filme. Vão ficar imaginando a situação para o resto de suas vidas.
E o que deve sentir o homem que estava com ela, se ele se lembra daquele sujeito meio com cara de inofensivo? Se este homem se lembra daquele homem, agora deve morrer de raiva que aquele homem aparentemente inofensivo passou uma cantada mundial na mulher dele... E que ganhou muito, mas muito dinheiro com isso! Imaginando que essa história é real e que essa cena aconteceu mesmo. Sabe? Não temos segurança de nada. Por isso dou muitas voltas antes de falar o que eu realmente quero. Como posso saber aonde eu começo e aonde eu termino? E não sabendo, como posso saber aonde uma relação comigo pode levar? Mesmo que eu queira prever, através dos meus sentimentos até hoje, como posso saber que os anos que eu passei estudando a mim mesma não serviram para alterar o meu futuro? E como eu posso pensar que todas as mudanças que eu causei em mim mesma não serviram para que eu consiga aproveitar uma abertura de porta no seu movimento natural, sem que eu precise tocar na sua maçaneta nem para que ela se abra ou se feche. Sabe?
Mas o que eu quero dizer mesmo é: eu quero amar. E para amar, eu preciso tentar. E para tentar eu preciso não temer. Porque se eu pensar que algo pode dar errado, então tudo pode dar errado. E se eu não temer, posso pular de cabeça numa piscina seca. Então é bom que eu tema um pouco. Não são muitas as opções. As escolhas no amor não são justas, e não são tão previsíveis. E as minhas apostas... Estou apostando no preto ou no vermelho? Either way it sounds bad. If my heart turns red, it’s because it is bleeding, or because I’m in love. If it turns black, well, that story everybody knows so well… Eu digo que eu quero não passar a mão na maçaneta e então, chuto com força as janelas. ABRAM-SE! Eu comando. E nada acontece. Nada acontece. Nada nunca acontece. E eu espero. Eu virei a história ao contrário e ninguém sabe do que estou falando. Mas consegui transformar o conto original em uma história. Eu sou a roteirista do filme. O James Blunt do meu metrô. E eu sorrio para mim mesma, e eu sou a escritora e sou a própria musa. Eu começo e termino em mim mesma. Não vou ficar pensando para o resto da vida. Eu sei aonde eu vou. Eu sei como a história termina. E eu nem preciso ficar acordada vendo o final do filme. Agora posso sonhar com o final que eu quero.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

The Bad Ass Alex x A Alex protegida

Listening to L7, Bricks are Heavy.

Me sinto bem Bad Ass quando dirijo ouvindo esses sons distorcidos no carro. Se o carro fosse preto, eu seria então, bem mais bad ass. Mas a verdade é que o cachorro só late quando se sente ameaçado, quando está com medo. E a verdade é que quanto mais agressivo é o visual de alguém, mais ele está tentando passar uma mensagem ao social de que sabe se defender, sabe latir e sabe morder, e mais está escondendo uma sensibilidade enorme por trás do visú repelente.
Mas gostaria de derrubar essa muralha que é o "eu" exteriorizado, e exibir o "eu" de dentro. Esse eu que tem medo confrontar o mundo, medo de se impor, de se colocar, de dizer o que quer com medo de mais repressão. O eu que precisa de carinho e que chora com as caras feias que vê. O "eu" exteriorizado é cabeça fria, self spoken, libertário, permissivo, atraente, mágico, transformador, expansivo, corajoso... O eu de dentro é escondido, tímido, conservador e temeroso. Engraçado como a gente se divide em pedaços! Mas só vejo os pedaços porque quero uní-los com amor. Fazem parte de um conjunto unido pela pele. A pele que é o meu maior órgão sensível e também a primeira muralha. Através da minha pele está a entrada para o interior. Se você me tocar e fizer eu me derreter, então o eu interno aparece. Mas eu preciso confiar no seu toque, caso contrário, você não conseguirá se aproximar, porque eu rosno. Alto.