segunda-feira, setembro 01, 2008

O sopro de Hécate

Portal da sala, corredor de vento, vento frio sopra, soprando, levando meus cabelos, beijando minha face, arrepiando meus pêlos. Lembro desse frio, lembro desse gozo na dor, no passado, nas feridas antigas e abertas, nas águas paradas. Percebo todos os filhos que nunca nasceram, não só meus, mas de todas as mulheres, e que ficaram todos dentro da minha barriga e esse vento é quando eles retornam, e pairam ao meu redor. A presença das almas, de tudo o que já passou mas que eu me recuso a deixar ir, a presença de todos os amados que nunca puderam ser carregados próximos ao coração. O leite que nunca jorrou não jorrará também durante o inverno. Nada vai florescer pelos próximos dias. Ela engoliu uma única semente. Foi só o que foi preciso. A semente que não explodiu, a fez viver no inferno. A semente que não germinou, a deixou presa e fez com que a terra toda secasse. Todos os sentimentos não passam da garganta. Tudo mais ficou intragável. Todas as sementes geradas pela imaginação fecunda não pesariam tanto. É um espinho de amor, preso ao coração, que a faz sangrar eternamente enquanto os dias passam e o sol ainda existe. E ela só vive à noite, pois é quando o frio aumenta que o peso diminui, e que ela consegue respirar.

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