quinta-feira, novembro 26, 2009

Mostra-me a tua face

Então a lua mostrou-me a sua face. Os seus olhos eram malignos, com um redor avermelhado, como o olho de um homem raivoso que ilumina o céu da noite e que me vê. E nos vemos mutuamente, de forma que não posso esconder-me. Hipnotizou-me como olhos de outrora. Passaram-se quase oito horas desde que liguei "Os Maias" e não consegui parar de me embevecer de um drama muito pior do que o meu... E que fez com que, de repente, percebesse que não há uma realidade muito pior para uma mulher do que ser uma mulher em Eça de Queiroz. Tão embevecida, tão hipnotizada estava que mal havia reparado que já se passaram vinte e cinco minutos da meia noite e que, por isso, podia ser explicada a quietude da noite, a paz de luzes apagadas e de televisões desligadas. Eu e um cigarro de palha, um que havia sobrado de uma lua há muitas noites anteriores. Um cigarro sem gosto de fábrica, um cigarro sem consequências a não ser a quietude da noite dentro de mim. Passei o dia com uma dor presa no coração que não sei o que é. Hoje conversei com o cacique de um tribo indígena brasileira e perguntei-lhe se mulheres podiam usar cocares; ele me disse que sim, que as mulheres deveriam ser coroadas como sagradas que são. Pedi-lhe então para ser coroada dentro da sua tribo, para que eu pudesse usar o cocar em todas as minhas apresentações, como guardiã de um segredo muito profundo e conhecido apenas para os povos da floresta. Apenas as pessoas que entendem a pureza da natureza entederão o meu coração. Assim sou eu: virgem, indomada, livre, cheia de vida, amedrontadora e submissa à lua como quem sabe a que dono pertence. Esses olhos malignos que me põem a adormecer, esses olhos que ainda agora me olhavam com tanta fúria e que agora se escondem atrás do prédio, que fogem de mim, que se refugiam atrás de novas aventuras. A vida nunca foi justa conosco, mulheres, e agora descobri o motivo da nossa devoção à lua: é um homem, maligno e negro, a brincar.

2 comentários:

Davi Araújo disse...

Evohé, Alexabdra!

Adorei o blog. Agora tem 21 seguidores...

Abreijos textuais

Inara Vechina disse...

as mulheres deveriam ser coroadas como sagradas.e como algumas mulheres podem esquecer desse estado puro? eu não sei. ás vezes quando deixo muito do mundo entrar no meu centro, coloco ás mãos no útero pra lembrar que a única coisa que não posso deixar ser violada é essa essência.