O último dia da vida dela
Acordou, sentou-se na sala, fez carinho na gata, deitou-se, dormiu por cinco minutos relembrando o sonho que teve na noite anterior. Levantou-se, fez carinho na gata, foi até a cozinha tomar café da manhã. Viu que a mãe havia comprado pães e pães- doces. Viu que um dos pães-doces estava cheio de formigas. Limpou as formigas. Sentou-se, comeu. Foi até o quarto, tentou dormir mais um pouco mas não conseguiu porque queria escrever o sonho e porque estava espirrando. Abriu a gaveta, retirou o diário e foi até a sala novamente para escrever. Escreveu. Acabou a tinta da caneta antes que ela pudesse terminar a lista das pessoas que gostaria de ver no seu aniversário. Na noite anterior, teve sonho de festa aonde ela não podia entrar, porque só podia entrar quem se vestia diferente, e só depois ela foi entender, no sonho, que o diferente era ser alienígena vestido de gente, e que a festa era para a família do outro, que era composta por alienígenas, e ela não sabia qual deles era aquele que andava dormindo com ela. Ficou intrigada com o sonho, sabia que o outro e sua família eram alienígenas. Sabia o que ia acontecer.
Esta foi sua manhã.
Depois, as amigas vieram à sua casa. Conversaram, discutiram suas relações problemáticas com seus respectivos, traçaram planos, conversaram mais, riram de como os homens são babacas e resolveram ir à praia. Mas antes, comeram uma refeição feita em casa na última quinta-feira. Hoje era domingo. Mas antes, ela teve uma conversinha tola ao telefone com o outro em questão. Alguém bem pequeno. Um outro que pela pouca idade não sabia de quase nada. Ela decidiu não continuar com aquilo. Idades diferentes, pensamentos diferentes. Vontades diferentes, visões diferentes. Mas a mesma conclusão. Houve um pé-na-bunda em sua tarde. Mas dessa vez foi dado, não recebido. Ela ficou feliz, porque conseguiu dizer o solene “não”, de “não quero isso para mim”, que a deixou bastante orgulhosa. Mas teve que ouvir antes uma conversinha tola ao telefone sobre AIDS, sobre como ele havia feito sexo oral sem camisinha com outra durante o carnaval e, que agora, estava preocupado. Teriam que fazer exames. Ela riu. Não existia aquele nós. Achou melhor ouvir isso ao telefone do que ao se encontrarem, pensou. Assim não precisava encontrar. Tudo ficava resolvido ali. Cada paranóia com seu dono. O menino solto em suas aventuras, com muito medo de contrair AIDS. A mulher livre para encontrar o amor. Comeram. Saíram para a praia, lindas, durante o pôr-do-sol. Chegaram à Ipanema, o sol estava colorindo o céu em cores de fogo degradê. Ela e a amiga resolveram pular no mar. As duas com medo de água fria e ondas até o pescoço. As duas com medo de bichos que nadam sem ser vistos e lixo flutuante. Ficaram no mar por um instante e tentaram sair antes da maré subir, antes que as ondas começassem a ficar mais agressivas. Medo de onda. Correram até a areia. Ela sentiu-se aliviada de, pela primeira vez, mergulhar no mar com gente medrosa também. Dava mais coragem, sentiu-se aliviada, conseguiu aproveitar mesmo que por um instante. Quis tomar uma água de côco. Foi uma delícia, apesar de ter que se desviar das pessoas que estavam se recusando a admitir o fim do carnaval daquele ano. Essas pessoas a incomodavam bastante.
Encontraram mais amigas, amigas de ex-namorados, amigos recém feitos em festa gay. Andaram, andaram, andaram. Resolveram ir andar de pedalinho na Lagoa. Mas antes, ela pediu para a amiga parar num posto, para ela comprar um sorvete. Comeu o sorvete, chegaram tarde ao pedalinho. Já estavam recolhendo os cisnes. Ela ficou muito triste. Ela queria muito ir até o meio da Lagoa com o pedalinho de cisne.
Todos se despediram. Elas voltaram para o carro, resolveram ir para casa. Foram para casa. Ela pensando que será um dia maravilhoso aquele em que conseguirem voltar lá para andar de pedalinho durante o pôr-do-sol. No caminho para casa, no túnel Rebouças, levou um tiro na cabeça e morreu.
Acordou, sentou-se na sala, fez carinho na gata, deitou-se, dormiu por cinco minutos relembrando o sonho que teve na noite anterior. Levantou-se, fez carinho na gata, foi até a cozinha tomar café da manhã. Viu que a mãe havia comprado pães e pães- doces. Viu que um dos pães-doces estava cheio de formigas. Limpou as formigas. Sentou-se, comeu. Foi até o quarto, tentou dormir mais um pouco mas não conseguiu porque queria escrever o sonho e porque estava espirrando. Abriu a gaveta, retirou o diário e foi até a sala novamente para escrever. Escreveu. Acabou a tinta da caneta antes que ela pudesse terminar a lista das pessoas que gostaria de ver no seu aniversário. Na noite anterior, teve sonho de festa aonde ela não podia entrar, porque só podia entrar quem se vestia diferente, e só depois ela foi entender, no sonho, que o diferente era ser alienígena vestido de gente, e que a festa era para a família do outro, que era composta por alienígenas, e ela não sabia qual deles era aquele que andava dormindo com ela. Ficou intrigada com o sonho, sabia que o outro e sua família eram alienígenas. Sabia o que ia acontecer.
Esta foi sua manhã.
Depois, as amigas vieram à sua casa. Conversaram, discutiram suas relações problemáticas com seus respectivos, traçaram planos, conversaram mais, riram de como os homens são babacas e resolveram ir à praia. Mas antes, comeram uma refeição feita em casa na última quinta-feira. Hoje era domingo. Mas antes, ela teve uma conversinha tola ao telefone com o outro em questão. Alguém bem pequeno. Um outro que pela pouca idade não sabia de quase nada. Ela decidiu não continuar com aquilo. Idades diferentes, pensamentos diferentes. Vontades diferentes, visões diferentes. Mas a mesma conclusão. Houve um pé-na-bunda em sua tarde. Mas dessa vez foi dado, não recebido. Ela ficou feliz, porque conseguiu dizer o solene “não”, de “não quero isso para mim”, que a deixou bastante orgulhosa. Mas teve que ouvir antes uma conversinha tola ao telefone sobre AIDS, sobre como ele havia feito sexo oral sem camisinha com outra durante o carnaval e, que agora, estava preocupado. Teriam que fazer exames. Ela riu. Não existia aquele nós. Achou melhor ouvir isso ao telefone do que ao se encontrarem, pensou. Assim não precisava encontrar. Tudo ficava resolvido ali. Cada paranóia com seu dono. O menino solto em suas aventuras, com muito medo de contrair AIDS. A mulher livre para encontrar o amor. Comeram. Saíram para a praia, lindas, durante o pôr-do-sol. Chegaram à Ipanema, o sol estava colorindo o céu em cores de fogo degradê. Ela e a amiga resolveram pular no mar. As duas com medo de água fria e ondas até o pescoço. As duas com medo de bichos que nadam sem ser vistos e lixo flutuante. Ficaram no mar por um instante e tentaram sair antes da maré subir, antes que as ondas começassem a ficar mais agressivas. Medo de onda. Correram até a areia. Ela sentiu-se aliviada de, pela primeira vez, mergulhar no mar com gente medrosa também. Dava mais coragem, sentiu-se aliviada, conseguiu aproveitar mesmo que por um instante. Quis tomar uma água de côco. Foi uma delícia, apesar de ter que se desviar das pessoas que estavam se recusando a admitir o fim do carnaval daquele ano. Essas pessoas a incomodavam bastante.
Encontraram mais amigas, amigas de ex-namorados, amigos recém feitos em festa gay. Andaram, andaram, andaram. Resolveram ir andar de pedalinho na Lagoa. Mas antes, ela pediu para a amiga parar num posto, para ela comprar um sorvete. Comeu o sorvete, chegaram tarde ao pedalinho. Já estavam recolhendo os cisnes. Ela ficou muito triste. Ela queria muito ir até o meio da Lagoa com o pedalinho de cisne.
Todos se despediram. Elas voltaram para o carro, resolveram ir para casa. Foram para casa. Ela pensando que será um dia maravilhoso aquele em que conseguirem voltar lá para andar de pedalinho durante o pôr-do-sol. No caminho para casa, no túnel Rebouças, levou um tiro na cabeça e morreu.
Um comentário:
Devia maquiar a morte.
Foi a única coisa que não soou muito verdadeira.
Ainda bem que é simbólica.
Novo ciclo, não?
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