É mentira que a mentira tem pernas curtas. As mentiras têm pernas extensas, e correm quilômetros. Todos os filmes que começam com uma mentirinha de nada que vai virando uma bola de neve são baseados em fatos reais: a mentira embola. E vira uma verdade extensa. Um tapete de muitos e muitos metros, cheios de detalhes tecidos e de pessoas entremeadas. Quanto mais pessoas participam da mentira, maior ela fica. E a rede da mentira passa a ser infinita. Mas o ruim de mentir é que dá um friozinho na barriga... Medo de que descubram a verdade. E então, mentir vicia. E, assim, mentir vira uma aventura, vivida por quem está fazendo algo que talvez não devesse, e que definitivamente não quer contar. Vira uma travessura, uma saborosa irresponsabilidade para um dia atípico. Essa é a parte um da mentira.
A parte dois é que "mentir deixa a alma preta", como dizia o meu pai, e então é impossível mentir impunemente...
O que eu estou chamando de mentira é o que você deveriam estar se perguntando. Não assumam tão rapidamente que já sabem, por causa do conceito de cada um sobre a mentira. Ou não pensem que eu seja uma pessoa compulsivamente mentirosa, porque isso seria fácil demais. A mentira é um construto, como qualquer outro, podemos chamar também de máscaras sociais.
E usá-las é um tanto quanto cansativo, dada a necessidade.
Estou cansada de mentir para o mundo. Ficar inventando desculpas que justifiquem minhas vontades fora de hora OU ter que responder a alguém que vem lhe cobrar uma posição.
Sou obrigada a inventar desculpas que contornem a situação sem entrar num conflito direto, quando talvez, eu devesse fazer exatamente isso. Olhar o bicho nos olhos e comê-lo vivo.
Atacar, latir. Arranhar o seu focinho.
Professoras universitárias me ligando para perguntar por que eu não fui fazer a prova? O proprietário do apartamento me colocando contra a parede pintada pra perguntar por que eu quero morar sozinha? O mundo cobra uma posição. E eu não defini a minha. Quer dizer, sei exatamente a minha posição, mas para que o mundo não entre em conflito direto comigo, esse mundo prático e institucional, fico desviando por outros caminhos.
Então vocês vêem como a mentira está profundamente arraigada dentro de nós, envolvendo nossos órgãos e vísceras. Puxar a linha da mentira e ir puxando, fazer sair pelas orelhas, pela boca ou até pelo umbigo... E vamos ver no que vai dar. Eu dou notícias. Quando eu parar de ficar pedindo desculpas por quem eu sou, ou inventando justificativas para os meus quereres. Eu dou notícias.
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