terça-feira, junho 19, 2007

Mulher-sol

Sou um sol. É da minha natureza se doar. Não há vida sem meus raios, não peço licença para entrar e clarear. Não me peça para conter forças. Se há uma planta nascida em descampado que não possa conviver comigo, ela morrerá, porque meus raios iluminam a todos, sem distinção. Mas digo que é preciso haver sombras. É preciso esconder-se nelas em alguns momentos. Não sou para sempre; sou e não sou. Mutável. Vida e noite, morte e dia. É preciso transmutar. É preciso acordar para o sonho e dormir para a vida. É preciso também acordar para a vida e dormir para vir a sonhar. Enquanto metade faz uma parte, a segunda metade faz a outra. Sexo de natureza natural. Mescla-se nos processos do passar das horas, acompanhando o tempo, sendo um ritmo, uma vibração tocada no órgão genital. Há também a generosidade árida da verdade, a autoridade da luz na cara, a verdade que corta, queima e dilata. A verdade dita um rumo, não reflete os ecos. Quem quiser acredita e segue, quem quiser encontra a sua própria. É preciso observar o tamanho das pupilas quando diante de uma verdade, para saber se foi bem ou mal dita. E é preciso haver uma mulher-sol e um homem-lua para que a vida continue ocorrendo, para que o encontro seja de um amor único. O meu doar é espermosgástico. Não existe vida sem o meu prazer e ele é expositivo, explosivo. É através de mim que o universo nasce, se expande, gira, gira, gira, se dilata e morre. É sempre através de mim, do meu entorno. É através dessa vagina que passa a criança escolhida, para ser coroada, imitando o nascimento do universo. São muitas verdades que se mesclam na minha superfície de lava. O movimento é intenso. São milhões de universos e verdades e a criança nem sempre é nascida em carne e osso. Todas as idéias são crianças em potencial; aquela que irá fecundar o cerne de minha fronte será a mais especial, que está em total comunhão com a natureza das coisas do seu mundo e de todos os outros. Assim nascem as pessoas, pequenos sóis em suas órbitas criativas, em milhares de galáxias distintas. Quando tentarem apagar a minha luz, estarão escolhendo a não mais vida. Minha morte significa a morte para todos, de dentro ou de fora da sombra. Não sou uma vela, sou um sol. E precisa de roupa espacial para se aproximar, uma que ainda não inventaram, ou a pessoa precisa ser feita de cinzas. Qualquer outro elemento é consumido instantaneamente. Desconheço meu tamanho, desconheço meus efeitos, não peço licença, não tenho pudores, apenas sol.

Nenhum comentário: