sábado, junho 02, 2007

Enjôo de alma na gruta de Perséfone

Transaram. Não havia sido tão bom quanto na imaginação, a preliminar inicial que só acontece na mente de alguém que se prepara para um ato, melhor dizendo, a punheta mental. A mente masturba o corpo até o ponto em que o tesão precisa explodir no plano físico. Era como em um sonho; de repente ela percebera que confundira os planos. Aquele tesão que sentia bem abaixo do umbigo, que lhe queimava a fronte e as partes baixas durante o dia inteiro era um tesão pela vida, projetado nas pessoas. Antes, era um tesão por si mesma, numa constante relação sexual narcisista.

Enfim, já tinha desistido da idéia de experimentar o seu Édipo quando ele manifestou a vontade dele, uma vontade detestavelmente senil, talvez decorrente dos trinta anos de diferença em idade entre eles. Aquela necessidade absoluta de se ter certeza do que se está fazendo, essa mentira constante que insistimos em contar a nós mesmos, mesmo até a qualquer custo, tentando controlar as situações que se apresentam nas nossas vidas num gesto único e desesperado de constatação da total falta de controle. Quando paramos de controlar, deixamos fluir. E como podem, as pessoas deste mundo, simplesmente deixar o fluxo correr? Não podem, não se deixam. Precisam controlar. Mas cansaço. Fizeram o que ela já tinha decidido não fazer. “- Decidimos as coisas para podermos ir contra nós mesmos.” – pensou; “Isto é uma relação neurótica, e quero ser saudável.” Beijou o ombro direito.

Nelson Rodrigues me disse que a nacionalidade brasileira nos faz sobreviver fazendo piadas. Uma condição básica para existir com saúde é saber rir de si próprio. É uma ação permissiva para com o próprio umbigo, se permitindo ir em frente, se atirando nas experiências e, depois, rir com os ratos. “Hum... Que sensação gostosa estou sentindo, bem lá em baixo... Quero ser preenchida por vida, estou preparada, estou molhada e tenra. Vamos lá, vamos ver o que acontece se eu abrir as pernas e me deixar tocar, me deixar ser sorvida, me permitir me doar naquele mel. Eu sou um mel. Doce. Redundantemente doce.”

Assim passava seus dias, a cada momento que parava, queria ser preenchida. Era um tesão na contravenção, e teriam gozado muito mais de seus corpos e de suas presenças se não fosse a inadequação social e todos aqueles problemas de enfrentamento de uma própria limitação psicológica através da sociedade, já que ambos sentiam o mesmo tesão e a mesma tensão. Que relatórios dariam aos olhos curiosos que invadiriam a atmosfera daquela dupla? E ambos sentiam que passariam a dever explicações ao mundo. A falta de liberdade que assola a humanidade por conta do livre arbítrio. Construímos nossas próprias correntes e arrastamos nossas cruzes quando nos encarnamos neste mundo e não temos nenhuma desculpa por escolher a dor ao prazer, já que é sempre uma escolha nossa. Mas é tudo sempre tão interessante. Prazer junto com a dor. Prazer e dor indo e vindo, se misturando, saliva correndo, assim como outros fluídos.

Lençóis bagunçados. Pessoas deitadas uma ao lado da outra, agora nuas, sem moral nem máscaras, apenas montadas em suas inadequações à convivência com tudo o que é humano e que habita em seus corpos. Sem o fogo do espírito, eram apenas duas carcaças podres. Era esse olhar que tinha em seus olhos quando virou para o lado e encontrou uma pessoa não mais interessante. Consumido e exaurido em poucas horas. Os momentos são mesmo muito voláteis! Em dois segundos colados, no primeiro algo existe e, no segundo, não existe mais. E ela sentia-se como uma devoradora de homens, a natureza que realmente tinha e que só podia manifestar secretamente em seus desejos. Devorava os homens com propriedade e suculência. Adorava sorver suas almas naqueles beijos, naqueles gemidos. Uma vez a presa devorada, ela encontrava-se presa a essa realidade, já que uma vez a alma absorvida, a pessoa encontra-se sem vida própria e ela passava a ser responsável por aquele ser inseguro e confuso que se encontrava ao seu lado, dizendo “eu te amo”. Cansaço e agora, um pouco de nojo. Indigestão seria a melhor palavra, pela prática constante da gula do seu apetite sexual, somada à curiosidade. Tem a conta exata das carcaças que existem em putrefação dentro dela. É o que restou daquelas relações e também é o contato com seu próprio esgoto. Não consegue aceitar que, no estágio de idealização e fantasia, o sexo é um contato com os céus e que, depois de consumado, é um contato com seus infernos. Não poderia chegar a nenhuma outra conclusão a não ser a de que ainda era uma romântica, um tanto gótica, mas romântica.
“-Dormir agarradinhos? Você deve estar maluco. Estou indo embora. Não vamos fingir que exista intimidade; eu ainda preciso de um pouco de verdade.” – ela disse. Devolveu a alma a ele, antes que vomitasse todos os anos anteriores. Precisava estar a sós consigo mesma, dentro da sua gruta mágica, escura e silenciosa para reorganizar os mortos.


2 comentários:

Felipe Bellard disse...

Vou precisar de novo, mas sobre a primeira impressão, se assemelha tanto a tudo que eu tenho vivido dentro da minha cabeça no último mês...

Quando tiver terminado a segunda leitura, farei um novo comentário, com mais substância... ;)

Beijos!

Natacha disse...

Entendo.

Sabe que tanto entendo que assino embaixo quando dizem que a mente é destrutiva.

Qual caminho meu self quer? Porque a minha mente psicodélica entorta todos os caminhos divinos que eu poderia seguir?

Não é bom ser sorvida, eu já fui caça de muitos homens. Carcaça na cama. Sem alma. No final, eu tinha tanta alma na cama, mas era vista como carcaça.

Era tão sofrido fazer tanto sexo e às vezes nem mesmo gozar, e ter sido ali um mero massageador peniano diante de um homem que me sorveu o espírito.

O meu EU quer o amor como um todo. O meu EU quer a troca, o toque entre almas. O meu Eu não permite mais que eu seja caça, o meu eu, que já foi caçadora, voltou ao caminho e não quer a mente.

Quero a fluidez dos sentimentos. Sem o bedelho da mente no meio.