O grafite apontado da lapiseira é como uma agulha que perfura o papel imprimindo nele tatuagens, como os pensamentos mancham a alma e a incitam de sentimentos, o grafite vai manchando as folhas de papel, derramando em palavras as coisas mais líquidas, borrando a tinta com a mão canhota. Essa é a prática da escrita, um borrão em forma.
E a vida? A vida pode ser lida pelas páginas escritas? Ou justamente a vida é o que existe entre uma linha e outra, entre uma palavra e outra, entre uma respiração e outra daquele que escreve?
É possível proteger-se com palavras e, no mostrar, esconder-se? No pé carrego uma tatuagem que o protege de tropeços e topadas. O outro pé, que não acredita em nada, o que ficou livre, vive tropeçando por aí; é dele o dedinho que sempre sobra contra as parades, pés de móveis, etc. Mas não mais quero acreditar no que está escrito lá naquele; no entanto, não posso apagar. Apagar essa memória seria como tentar contornar as cicatrizes da alma, não se faz. É como jogar esmeraldas no lixo. Se Milan Kundera narra que está no sexo as pérolas preciosas de cada um, os segredos que não podemos mostrar em público, se ele acredita que é no sexo que está a porcentagem milionésima que distingue as mulheres uma das outras, a porcentagem do inesperado e da diferença, eu acredito que essas pérolas estejam na alma, nas cicatrizes que cada pessoa carrega. A sexualidade é apenas uma das portas, mas existem muitas outras. Não entendo por que as pessoas guardam suas riquezas apenas para si. Talvez sejam pouco generosas, talvez tenham medo de que outra pessoa possa lhes roubar. Nada que seja por demasiado real; é como temer que alguém, ao apreciar uma tatuagem, possa lhe recortar da pele aquele pedaço de desenho. Nossas jóias estão encrostadas na alma e se não podemos de fato entregá-las a ninguém, podemos, ao menos, mostrá-las. Quando o sol bate nessas pedras, reflete as luzes mais incríveis.
Um comentário:
O início do seu texto (lindo) daria uma bela letra de música ;)
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