segunda-feira, agosto 03, 2009

historinha

Havia uma garota que sofria a influência de muitos e muitos astros. A Vênus dela era bem promíscua, porque se relacionava com a Lua, com Marte, com Júpiter, com Saturno, com Urano, Netuno, Plutão e mais alguns pontos. E na vida também ela tentava equilibrar todas essas forças atuantes, porque em cada momento uma falava mais alto, sendo que várias delas falavam alto sempre, por trás, como um cenário básico que é sempre o mesmo que, por serem mais pesados, quase não caminhavam de acordo com a nossa perspectiva humana. Ela sempre sonhava acordada com um homem que a abraçasse por trás e a beijasse com paixão no pescoço, e eles estavam sempre em casa. A paixão era só o sentimento, não a forma como era beijada. O beijo, em si, era bem delicado e gentil, porém o conjunto do abraço e do beijo era intenso e apaixonado. O homem também mudava, dependendo em quem estivesse projetando aquela energia no momento. Ela também sempre sonhava com um homem que gostasse de a observar em cada movimento seu, e que queria abraçá-la toda hora que tivesse chance, e que fosse fiel por saber que, no mundo, nenhuma mulher seria como ela. Sonhava, sonhava, sonhava. O sonho era um desses cenários, sempre presentes. Os abraços e os beijos apaixonados, e outras cenas mais picantes (no banheiro, na cozinha, no chão, na cadeira, no chuveiro e na cama), também faziam parte desse sonho constante. Mas, quando se apaixonava, apesar de ser muito séria, era sempre de cara, e caía de cara e ia de uma vez só. Por isso, quase nunca se apaixonava. Todas as suas vezes anteriores a haviam deixado com marcas de achatamento facial. Mas o aspecto da aventura e da conquista, do novo e diferente, da excitação da primeira vez constante fazia com que os homens não se sentissem tão importantes assim porque quem conquistava era ela, e então, não a levavam tão a sério. Mesmo aqueles com o discurso mais libertário e que, no fundo não admitido, eram machistas e antiquados. Estava aprendendo que ela mesma era antiquada e até machista em alguns pontos; ela mesma brigava consigo quando era forte demais, quando era qualquer coisa demais. E ela percebia como era difícil produzir essa peça com tantas coisas diferentes que precisavam ser incorporadas em um mesmo cenário e quantas linhas faziam o texto, mesmo as que não eram ditas. Estava aprendendo que o desejo ardente era um vício e uma forma de levá-la ao sofrimento. Era apenas um vício criado pelo corpo que queria permanecer sentindo a sensação do sonhar. Ficava muitas horas sentada de frente para o próprio teatro imaginando o enredo da próxima peça. Cada vez mais próximo do que queria, cada vez mais sensação e mais sofrimento, cada vez mais longe da verdade nua, cada vez mais só e mais única e mais dona de si e mais assustadora. Sabia que o que via como o demônio dentro de si era autenticidade e força, mas tinha medo de deixá-lo sair por ser forte demais. Era devastador. E ela era tão magnética quando mostrava as suas garras, que ficava quase impossível de resistir a ela, quando realmente mostrava a que chifres veio. Mas também se assustava com isso, e procurava a medida exata de si pois... O irresistível nela reforçava o desejo ardente e massacrava todas as outras forças. Então tudo o que sentimos ao lidar uns com os outros ou é mero desejo ou aversão? Sentia-se injustiçada de ser tão simplificada pelos orientais, mas estava disposta a tentar. Afinal, o novo e o diferente eram sempre tão atraentes quando estava consigo apenas.

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