É preciso haver filtros. Cortinas coloridas translúcidas, pelas quais a luz possa passar quebrando em tons magníficos. Lentes de óculos escuros, uma para cada humor, para quantos dias for necessário. Até lentes cor-de-rosa sim, por que não? As vermelhas já não tanto me atraem; acho o mundo por demais marcial e cheio de UV para que mais vermelho seja pintado às bordas do meu mundo. Rosas perfumadas em cima da mesa; nunca havia visto uma rosa lilás, nem outra pink. Comprei uma de cada e ganhei mais uma. Estão belas, me olhando. Sol do meio-dia. Que mau-humor! Metade do dia hábil já se passou e estou começando o meu agora; mania de ser noturna, mania de criança de resistir (ao sono). Sol entrava pela janela sem pedir licença e quente, pelando, lambendo a minha coxa, incomodando. Foi só fechar um pouco a cortina bela verde translúcida que o mundo mudou. Tudo mudou. Nesse pequeno gesto e simplório, a vida pareceu um tanto melhor. Pessoas se protegem de diferentes maneiras. Formam pensamentos rígidos para se proteger contra as idéias invasivas alheias. No meu caso, agora, não é bem uma proteção, não é uma barreira nem um enrigecimento; é uma adaptação, um truque, para que eu não precise engolir mais do que posso cuspir, nem engolir mais do que posso digerir. É que gosto da vida em cores fortes mas quebradas em tons pastéis, já que sou fã do sombreado e do escuro (apesar de temê-lo). É preciso passar a vida numa peneira. Pedras rolam sobre nossas cabeças nessa "ida ao mundo diário". Meu conselho: use um chapéu de ralador de pedra. E use quantas lentes quiser, quanto mais melhor, se aproxime mesmo da loucura, escute todas as vozes. Mas não deixe que todas entrem, para que você não precise engolir mais do que pode cuspir, nem mais do que pode digerir. Usar as cores para acalentar-se, para sentir-se mais belo, mais feliz, mais próximo do próprio mundo. Ir ao mundo com esse matiz, morar atrás do arco-íris.
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